«Como saltei cá para fora, escorregadio, nu! Sim, dum reino proibido e inacessível aos outros, sim, sei qualquer coisa, sim... mas mesmo agora, em que, dê por onde der, tudo acabou, mesmo agora... tenho medo de corromper alguém. Ou nada sairá do que quero contar, vestígios que são apenas os cadáveres de palavras estranguladas, como enforcados... vultos crepusculares de gamas e gerúndios, corvos patibulares... acho que preferia antes a corda, porque que sei de maneira segura e inelutável que vai ser o machado; um bocadinho de tempo ganho, tempo que me é agora tão precioso que aprecio qualquer pausa, qualquer adiamento... Quero dizer tempo consagrado ao pensamento; a licença que concedo ao meus pensamentos para uma excursão grátis do facto à fantasia e volta... Quero dizer muito mais além disso, mas a falta de habilidade para a escrita, a pressa, a excitação, a fraqueza... Sei qualquer coisa. Sei qualquer coisa. Mas exprimi-la é tão difícil! Não, não posso...»
Vladimir Nabokov , "Convite para uma Decapitação", Assírio & Alvim, 2006
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