sábado, 31 de março de 2012

Teoria da Conspiração #31 (ou Como num Sono Acordado)



«O acordar privilegiado não tem que suceder forçosamente quando se dorme. Dado que sono e vigília não são duas partes da vida, que ela, a vida, não tem partes, mas lugares e rostos. E assim, do sono e de certos estados de vigília, pode-se acordar deste privilegiado modo que é o acordar sem imagem.
Acordar sem imagem sobretudo de si próprio, sem imagens algumas da realidade, é o privilégio deste instante que pode passar de maneira inapreensível, deixando, sem dúvida, a pegada; uma pegada inextinguível, mas que não se sabe decifrar, pois não houve conhecimento. E nem sequer um simples registo desse ter acordado para este nosso aqui, para este espaço-tempo onde a imagem nos assalta. O ter respirado somente numa solidão privilegiada nas margens da fonte da vida. Um instante de experiência preciosa da preexistência do amor: do amor que nos diz respeito e nos olha, que olha para nós.» 


Maria Zambrano, "Clareiras do Bosque", Relógio D'Água, 1995

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