segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Corpus Christi Carol #8



«na hora de pôr a mesa, éramos cinco:
o meu pai, a minha mãe, as minhas irmãs
e eu. depois, a minha irmã mais velha
casou-se. depois, a minha irmã mais nova
casou-se. depois, o meu pai morreu. hoje,
na hora de pôr a mesa, somos cinco,
menos a minha irmã mais velha que está
na casa dela, menos a minha irmã mais
nova que está na casa dela, menos o meu
pai, menos a minha mãe viúva. cada um
deles é um lugar vazio nesta mesa onde
como sozinho. mas irão estar sempre aqui.
na hora de pôr a mesa, seremos sempre cinco.
enquanto um de nós estiver vivo, seremos
sempre cinco.»

José Luís Peixoto, "A Criança em Ruínas", Quetzal, 2012

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Teoria da Conspiração #47 (ou a Imaginação Pictórica da Língua)



«Imaginemos um povo de daltónicos, o que pode bem acontecer. Não teriam os mesmos conceitos de cor que nós. Supondo que falariam, por exemplo, alemão e teriam assim as palavras alemãs para as cores, usá-las-iam diferentemente de nós e aprenderiam a usá-las também de forma diferente. Ou se tivessem uma língua estrangeira, ser-nos-ia difícil traduzir as suas palavras de cor para as nossas.»

Ludwig Wittgenstein, "Anotações sobre As Cores", Edições 70, 1988

domingo, 22 de dezembro de 2013

a poesia não me interessa #48



No abismo aberto entre dois minutos
Mesmo caindo a mão levanto.
Existo. E digo: presente.

Zelk Zoltán, "Poetas Húngaros - Antologia", Edições Moraes, 1983

sábado, 21 de dezembro de 2013

Até hoje foi sempre futuro #14



«Não há, na verdade, muito a ganhar por perguntar, mais uma vez, qual a quilometragem até à lua ou qual é a fórmula para fazer ácido clorídrico. Nós sabemos as respostas.»

George Steiner, "Martin Heidegger", Relógio D`Água, 2013

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Toda a humilhação leva à morte #24



«O deserto cresce: ai de quem abriga desertos!
A pedra range na pedra, o deserto oprime e sufoca.
A tremenda morte olha, com parda ardência
e mastiga, – o seu mastigar é a sua vida...

Não esqueças, homem, requeimado pela volúpia: tu – és a pedra, o deserto, és a morte...» 

Friedrich Nietzsche, “Ditirambos de Diónisos”, Guimarães Editores, 1993

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

prove que não é um robô #6






















«Gostaria de poder achar um crime que tivesse repercussões infindáveis, mesmo quando eu tivesse deixado de agir. De tal modo que não existisse um único momento da minha vida, mesmo quando estivesse a dormir, sem que eu não fosse a causa de algum tipo de desordem. E gostaria de expandir essa desordem a ponto que acarretasse uma geral corrupção ou uma perturbação tão patente, que mesmo para além das minhas ilusões os efeitos permaneceriam.»

Donatien Alphonse François de Sade

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Imediatamente embora pouco a pouco #36



«Poderá alguém não saber nenhum segredo da vida, e viver?
- Tu podes morrer a qualquer momento - diria eu ao homem que olha sempre para o nariz ao encarar os outros, ou a esse que enfia os olhos nas unhas quando se sente só.
Quem não saiba nenhum segredo da vida, não tem amparo. Cai, mal o empurre um vento um pouco forte, varrendo-o o mar pelo convés.
Quando encontro quem nem sequer conhece um segredinho da vida, desespero-o, e depois fico a saber que a febre o foi comendo como um leão. Foi todo ele, seguramente, pastos de chamas.
Não saber, por exemplo, que devemos ver tudo quanto temos em redor, os talheres e os pratos, ao comermos; não saber o que cada qual deve colher dentre o que colhe, e a isso deve dedicar-se com afã durante o dia; desprezar tudo, pensar apenas na ambição, gastar o tempo olhando os fios de fumo etc. são coisas sumamente perigosas e desleais. Tudo isso e o resto que for da mesma laia tornam o homem perigoso. 
É preciso estarmos no segredo de que há realidade debaixo dos divãs, de que tem personalidade o homem guiando o carro que se some entre os mais carros; de que as roupas estão ao serviço da nossa realidade, e que sem a sua realidade rapidamente nós desapareceríamos. Até ao relógio devemos estar agradecidos. 
Pode andar sossegado todo aquele que possua muitos simples segredos da vida, porque à sua volta muita gente há-de morrer antes de a vez lhe tocar a ele.»

Ramon Gómez de la Serna, "O Médico Inverosímil", Antígona, 1998

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

electrocardioTrama #14 (ou a actividade dualista dos traços)



«Apenas no capítulo das bifurcações permanece aberto à esperança.» 

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Recomposições de Metades #6

«Quando acabou, o ateu se converteu, morreu.»
Jorge de Lima (1893-1953)

domingo, 15 de dezembro de 2013

se os mortos falassem #2


«ANJO - Louvaste, Séneca, as virtudes que tornavam o homem superior à Natureza e à desventura. Queres tu dizer até que ponto conseguiste conciliar as doutrinas com a vida?

SÉNECA - Convidas-me para a mais difícil tarefa que possa pedir-se a um homem. Temo, antes de tudo, a natural benevolência que cada um tem para consigo. Só quem houvesse lido as minhas obras e tivesse seguido passo a passo a minha vida poderia responder à tua pergunta, com alguma esperança de aflorar a verdade.» 

Giovanni Papini, "Juízo Universal", Livros do Brasil, 1959

sábado, 14 de dezembro de 2013

O Homem é um grande faisão sobre a terra #3


«Uma mulher levanta o braço. Está no passeio. Não tem pressa, mas levanta o braço e acena com a mão. O táxi não pára. Está vazio, mas não pára.
A mulher veste calças elegantes, castanhas. Tem um lenço ao pescoço.
De novo, vemos a sua mão levantada a acenar. Outro táxi que não pára.
A mulher está a sorrir. É bonita. Levanta o braço de novo. Estamos sempre a vê-la, a ver o seu entusiasmo sorridente. Mas não, de novo o táxi não pára. Também vazio, mas não pára.
O plano agora abre-se mais. Vemos a mulher, sim, as suas calças elegantes castanhas. E, junto aos seus pés, um corpo inerte; provavelmente morto.»      

Gonçalo M. Tavares, "Short Movies", Editorial Caminho, 2011 

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Pausa do mundo #2


«O maior apetite do homem é desejar ser. Se os olhos vêem com amor, o que não é tem ser» 
Padre António Vieira

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Perguntas Abandonadas #35


«Para onde irão depois as coisas que aprendi?
Por exemplo: aquele cálculo de pi.
Que será feito daqueles restos de saudade,
destes medos antigos sempre novos?
Em que voltas desaparecerão os sonhos
que enfeitaram de flores o quintal antigo?
Por que caminhos irão andar aqueles ágeis pés?
Sobretudo, como se esvaziará de som a velha voz
e onde afundará o último verde daquela flama esguia?» 

Abgar Renault, "Obra Poética", Editora Record, 1990

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

o poeta sabe menos que o poema #12


Enquanto lá fora avança do mar a fortalecida
onda que, de amores e desejos, nas palpitações
de um fugaz instante, tudo fará esquecer.

Paulo Teixeira, "Conhecimento do Apocalipse", & etc., 1988

domingo, 8 de dezembro de 2013

quero outra noite no fim do dia #21


«Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo.»

Apocalipse 3:20

sábado, 7 de dezembro de 2013

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Ouvido no estrangeiro #7


«If Control's Control is Absolute, then why does Control need to Control?»

William S. Burroughs

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

prisão de gelo



©Park,Chan-wook;2004

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

A revolução ficou atrás de nós #2


«No lugar onde caiu uma voz, onde faltou o sopro da respiração, um minúsculo sinal está suspenso, em cima. Sem outro suporte além deste, hesitante, o pensamento aventura-se»

Giorgio Agamben, "Ideia da prosa", Cotovia, 1999

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

ninguém é filho das ervas #25


«Abomino todos os modos de vida» 
Rimbaud 

domingo, 1 de dezembro de 2013

o Mal-estar da Civilização #39


«Geralmente, há no facto de ser homem um elemento pesado, fastidioso, que é necessário superar. Mas este peso e esta repugnância jamais haviam sido tão penosos como desde Auschwitz. Como vós e eu, os responsáveis de Auschwitz tinham narinas, uma boca, uma voz, uma razão humana, podiam unir-se, ter filhos: como as Pirâmides ou a Acrópole, Auschwitz é o feito, é o signo do homem. A imagem do homem é doravante inseparável de uma câmara de gás...»

Georges Bataille, "Sartre"