domingo, 15 de julho de 2012

Teoria da Conspiração #36 (ou a construção do leitor sustentável)



«Já muitas vezes se tem falado dos abusos da Biblioteca. Devem-se, em parte, à insuficiência do pessoal e em parte, também, a velhas tradições que se vão perpetuando. De tudo quanto se disse, o mais verdadeiro é que grande parte do tempo e da canseira dos distintos eruditos que ali desempenham as pouco lucrativas funções de bibliotecários é gasta a dar aos seiscentos leitores quotidianos os livros vulgares que se podem encontrar em qualquer sala de leitura; - o que é tão prejudicial para estas, como para os editores e autores para quem, a partir desse momento, se torna inútil comprar ou alugar livros.
Também foi dito, e com razão, que um estabelecimento único no mundo, como este é, não deveria ser uma lareira pública, uma sala de asilo, - cujos hóspedes são, na sua maior parte, perigosos para a existência e a conservação dos livros. Toda essa serie de ociosos, burgueses reformados, de viúvos, de solicitadores sem cartório, de alunos que vêm copiar as suas versões, de velhos maníacos - como era o caso daquele pobre Carnaval que aparecia todos os dias com um fato vermelho, azul claro ou verde-alface, e um chapéu florido, - merece sem dúvida, consideração; mas não haverá outras bibliotecas, e mesmo bibliotecas especiais, que lhes sejam facultadas?...»
      
Gérard de Nerval, "As Filhas do Fogo", Editorial Estampa, 1972

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