sábado, 21 de maio de 2011

Teoria da Conspiração #25 (ou o Tempo vs. Alfaiate)



«Virem de vez em quando do avesso os forros das algibeiras, porque nessa poeira de coisas, nessa penugem e cotão, é onde se criam e sustentam todos os micróbios. A putrefacção de muita gente, a gangrena da suas vidas, começou por esses algodões obscuros que não se sabe de onde vêm, por esse restos e migalhas misteriosos... Executem como autênticos cirurgiões a operação de arrancar aos vossos bolsos essas tumefacções e esse pus.
São esquírolas do passado, condensações de tempo, detritos do que passou, resultados de pássaros invisíveis que deixam cair essas coisas todas das árvores do tempo.
A higiene dos bolsos dos casacos, das calças, dos coletes, é uma das higienes mais descuradas.
Por mim, a primeira coisa que faço ao meus doentes é descarregar-lhes os bolsos, arrancar esses vermes colados às comissuras dos forros, tudo isso que cresceu na solidão e é concentração do tempo que morreu, final de horas e minutos que caíram mortos nas algibeiras como em rede de caçador.»

Ramon Gómez de la Serna, "O Médico Inverosímil", Antígona, 1998.

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